Quanto mais verde é a energia, mais rapidamente um veículo elétrico compensa em termos de efeito no ambiente. Ao longo do ciclo de vida, a sua pegada é sempre inferior à de um automóvel a combustão.
A luta de argumentos continua acesa, com os apaixonados por automóveis a combustíveis fósseis a tentarem por tudo defender a sua dama. No entanto, por mais estudos que se apresentem, por mais conclusões que se tirem, os carros elétricos têm sempre uma pegada ecológica menor do que os modelos a gasolina, a gasóleo ou híbridos. São responsáveis por quase três vezes menos emissões de CO2 na Europa, segundo a organização Transport & Environment. E esse impacto no ambiente pode ser - e vai sendo - reduzido ainda mais à medida que a tecnologia evolui, que a energia elétrica se torna mais renovável, e que surgem novas soluções para reutilizar as baterias.
Do poço à roda
A expressão ‘well to wheel’ (WtW), que se pode traduzir por ‘do poço à roda’, representa o custo ou impacto de todas as emissões poluentes associadas ao combustível. E esse método de classificação não é imediatamente favorável aos veículos elétricos, devido à forma poluente como muita eletricidade ainda é produzida no mundo. Contudo, o WtW pode ser dividido em dois: primeiro até ao ‘tanque’, e depois até à ‘roda’.
E no caso dos carros elétricos, se a primeira parte tem elevadas emissões associadas na produção da eletricidade, as mesmas ‘desaparecem’ na utilização. Ou seja, um carro elétrico não causa poluição direta, ao contrário dos veículos a combustão, que emitem constantemente gases pelo tubo de escape.
Por outro lado, países como Portugal têm já uma elevada percentagem de produção renovável de energia elétrica - acima de 60% -, que vai subindo cada vez mais. Isso reduz fortemente as emissões poluentes no momento da utilização de um veículo elétrico, enquanto as de carros a gasóleo ou gasolina se mantêm praticamente inalteradas.
O petróleo também precisa de eletricidade
É certo que a produção de um veículo elétrico - principalmente no que às baterias diz respeito - e a geração de eletricidade para alimentar o motor têm um elevado peso inicial no ambiente. Mas esse argumento, que é muito esgrimido relativamente aos carros elétricos, é frequentemente esquecido no que aos outros veículos diz respeito. A extração de petróleo e a sua refinação - bem como as cadeias logísticas associadas a estas atividades - também recorrem a um consumo tremendo de eletricidade.
A Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos (UVE), divulgou em março de 2021 um vídeo americano, traduzido e adaptado à realidade portuguesa, sobre as necessidades de energia elétrica - e não só - da indústria do petróleo. Uma das principais conclusões é que a energia elétrica usada, num mês, pela extração de petróleo em terra, nos Estados Unidos, e pelas plataformas de alto mar, seria suficiente para alimentar 5 milhões de carros elétricos (sensivelmente o mesmo que o parque automóvel português) durante um ano e meio.
E isto sem esquecer que, ‘no final do dia’, cerca de 70% do potencial energético do gasóleo ou gasolina é perdido na combustão, ao passo que um motor elétrico consegue uma eficiência superior a 85%, sofrendo perdas que frequentemente não passam dos 10%.
Eletricidade verde diminui ainda mais a pegada
A Volvo - uma das marcas mais empenhadas na transição completa para veículos elétricos - divulgou em novembro de 2021 um relatório que indica que o fabrico do seu modelo C40 Recharge gera mais 70% de emissões de gases de efeito de estufa do que a produção de um equivalente XC40, a gasolina. A notícia caiu como uma bomba, parecia uma contradição face ao que a construtora sueca defende, mas na verdade era precisamente o contrário.
O estudo da Volvo demonstra que esse modelo elétrico fica com as emissões abaixo do XC40, no máximo ao fim de 110 mil quilómetros, passando a partir daí a ter uma pegada ecológica sempre melhor. Isto usando como referência a produção de eletricidade convencional a nível global, com uma grande componente de origem fóssil.
Se for aplicado o mix de geração elétrica da União Europeia, com um peso renovável bastante maior, o Volvo C40 Recharge já só precisa de 77 mil km para atingir o break-even. E caso seja assegurada energia 100% verde para alimentar as baterias do carro, ao fim de 49 mil km o modelo a gasolina já está a poluir mais. Mesmo os 110 mil km são um valor que a esmagadora maioria dos carros ultrapassa, confirmando a muito menor pegada ecológica de um carro elétrico.
A Volvo também calculou as emissões poluentes para um ciclo de vida completo (estimado em 200 mil quilómetros), concluindo que a versão a gasolina produz 59 toneladas de CO2 para percorrer essa distância, mais do dobro do que um C40 elétrico a usar energia renovável (27 toneladas de CO2). A conclusão da fabricante sueca é que a pegada ecológica só não é favorável no início de vida de um carro e, quanto maior for o investimento em produção de eletricidade a partir de fontes renováveis, menor será o impacto dos veículos elétricos no ambiente.
Só a eletricidade cumpre as metas do acordo de paris
Um outro estudo do Conselho Internacional para os Transportes Limpos (ICCT), divulgado em julho de 2021, concluiu não só que os veículos elétricos têm sempre uma pegada ecológica melhor ao longo de toda a sua utilização - independentemente da origem da eletricidade -, como são os únicos (a par dos que usam hidrogénio verde) que conseguem cumprir as metas de Paris de limitar a subida da temperatura média do planeta.
O relatório do ICCT procurou usar valores de consumos e emissões realistas para todos os tipos de veículos analisados - e não apenas as tabelas oficiais divulgadas pelos fabricantes - destacando que mesmo os veículos híbridos ou híbridos plug-in ficam abaixo da eficiência esperada para o futuro do planeta.
Para o ICCT, a Europa - menos 66% a 69% de emissões ao longo do ciclo de vida - e os Estados Unidos (60% a 68% de redução) destacam-se na comparação entre um veículo elétrico e um modelo a gasolina. Mas mesmo em países muito dependentes de carvão e de outros combustíveis fósseis para a produção de eletricidade, os carros elétricos garantem uma pegada ecológica melhor. Na China, um carro elétrico poupa 37% a 45% de emissões ao longo da sua vida útil; e na Índia a redução de gases de efeito de estufa com a utilização do mesmo automóvel varia entre 19% e 34%.
Manutenção mais verde
A reduzida pegada ecológica de um veículo elétrico também pode ser medida pela sua manutenção. É frequente falar-se nos baixos custos de um carro elétrico com oficinas - não usa óleo, filtros ou velas; os travões têm menor desgaste; há menos peças em geral para substituir. Isso significa igualmente menos emissões poluentes associadas às tarefas de revisão em oficina, bem como ao fabrico, montagem e reciclagem de peças que têm de ser trocadas.
Num carro elétrico, a bateria é o principal - frequentemente o único - componente que pode ter de ser substituído, caso perca capacidade de carregamento. E não é sequer ‘obrigatório’ que isso venha a acontecer ao longo do ciclo de vida de um automóvel.
Baterias: vários caminhos para a sustentabilidade
Mito 1: "As baterias são poluentes"
É um facto que a produção de baterias para veículos elétricos (essencialmente de lítio) tem elevadas emissões poluentes associadas, mas essa pegada ecológica tem vindo a diminuir a cada momento com a evolução da tecnologia - quer para a extração dos materiais necessários, quer para o fabrico e rentabilidade das baterias.
Mito 2: "As baterias têm um tempo de vida curto"
Com o passar do tempo, as baterias de um carro elétrico vão perdendo a sua capacidade de carregamento, mas isso não tem comparação com um telemóvel, por exemplo, como muitos querem fazer crer. E a maioria dos fabricantes define um tempo de garantia para essas baterias, que se situa normalmente nos 8 anos ou mais de 150 mil quilómetros (na Tesla, por exemplo, assume-se que a bateria continua ‘boa’ se carregar acima de 70%).
Mito 3: "As baterias não são recicláveis"
Vários fabricantes estão a construir ou planear fábricas de reciclagem de baterias. Sendo o componente mais caro de um veículo elétrico, essas peças contêm metais e outros materiais valiosos, que podem ser reaproveitados no final do ciclo de vida. Por outro lado, a reutilização das baterias para armazenar energia para outros fins também é uma hipótese sempre disponível.
As baterias de armazenamento de energia oferecem um enorme potencial para a transição energética. E no caso dos carros elétricos, as baterias em fim de vida garantem frequentemente 60% ou mais da sua capacidade, mais do que suficiente para outras utilizações, domésticas ou comerciais.
Associada a painéis solares, por exemplo, uma bateria de um carro de cerca de 50 kWh pode abastecer 10 casas. O projeto 2nd Life, da EDP Inovação, estuda a reutilização de baterias automóveis e a sua durabilidade, tendo sido conseguidas capacidades de 80% a 90% ao fim de 2.500 ciclos de teste.
Os carros elétricos não são o futuro, são o presente. São a forma mais eficiente, económica e ambientalmente sustentável de mobilidade automóvel. Com recurso a carregamento em casa e a utilizar eletricidade verde, um veículo elétrico é um investimento que compensa a família e o planeta.